Uma epidemia de cegueira branca toma conta de uma cidade. Uma pessoa contamina a outra, em efeito dominó. A cidade pode ser uma qualquer grande metrópole, as pessoas podem ser quaisquer umas com quem nos tenhamos cruzado no metro. Podem ser o nosso melhor amigo ou um estranho que dorme na rua.
O ditado diz que “ em terra de cegos, quem tem um olho é rei”. Neste caso, ela é uma "rainha" condenada a assistir à podridão humana de olhos bem abertos. Esta "cegueira" de Saramago é sobre o poder da visão. Sobre o poder esmagador da visão quando realmente vemos e não nos limitamos a olhar.
O que se passa dentro do asilo é apenas um micro-cosmos para a nossa realidade diária. Qualquer noticiário está cheio de histórias semelhantes. A personagem de Julianne Moore representa aquilo que aconteceria se de facto não pudéssemos desviar os olhos e ignorar. Se as constantes violações do corpo e da alma não se tornassem banais porque são frequentes.
Em “Ensaio sobre a cegueira” tudo é assim: uma tela branca que serve de palco para a natureza humana. Embora seja considerado um cínico, Saramago é, nesta história, um autor isento. Coloca todas as personagens ao mesmo nível, sem quaisquer pré-definições de bem ou mal. Um "homem", uma "mulher de óculos escuros", uma "criança". Todas as personagens são descritas assim, sem nomes. Só existem factos banais e funções como "médico" ou "rei da camarata três". Até palavras como "ladrão" não acarretam julgamentos, são apenas descrições. São as próprias personagens que mancham a tela com as suas acções, provando que somos todos iguais, primitivamente violentos. Provando que talvez Saramago tenha razão na sua falta de fé na natureza humana. Mostrando que existe algo de profundamente assustador e belo nessa igualdade.
Quando os infectados pela cegueira são colocados em quarentena e retirados do seu “eu” civilizado, revelam a essência primitiva. Os grupos de camaratas diferentes tornam-se inimigos, começam os abusos de poder, as violações. As tentativas de "democracia" da personagem de Mark Ruffalo parecem patéticas, especialmente comparadas com o seu comportamento pouco recomendável. Quem é ele para julgar ou ditar? O asqueroso “rei da camarata três”, Gael Garcia Bernal, parece fazer mais sentido na sua falta de escrúpulos. Pelo menos soa a verdade no meio do caos.
Julianne Moore é a "mulher do médico". Ela é a única que consegue ver, tornando-se mãe, enfermeira, protectora, guerreira que faz das fraquezas forças. Uma espécie de hipérbole para o ser mulher que toma conta deste grupo.
O ditado diz que “ em terra de cegos, quem tem um olho é rei”. Neste caso, ela é uma "rainha" condenada a assistir à podridão humana de olhos bem abertos. Esta "cegueira" de Saramago é sobre o poder da visão. Sobre o poder esmagador da visão quando realmente vemos e não nos limitamos a olhar.
O que se passa dentro do asilo é apenas um micro-cosmos para a nossa realidade diária. Qualquer noticiário está cheio de histórias semelhantes. A personagem de Julianne Moore representa aquilo que aconteceria se de facto não pudéssemos desviar os olhos e ignorar. Se as constantes violações do corpo e da alma não se tornassem banais porque são frequentes.
Se todos sairmos desta "cegueira branca" como ela, a lutar com unhas e dentes pelas réstias de afecto e toque, então a esperança vive no fundo da caixa de Pandora. O preço por encarar o mundo em toda a sua dura complexidade é alto e muitas vezes desejamos estar cegos. Mas é esse frente a frente que torna o nosso amor por esse mesmo mundo ainda mais belo. Porque é um amor que está para além da beleza, que nasce nas entranhas fedorentas da Humanidade. Não precisamos de mergulhar nelas todos os dias mas "molhar os pés" de vez em quando intensifica tudo o resto. A beleza é mais rica quando é feita de sombras que lhe esculpem os contornos. Se elas não existirem, é apenas uma superfície lisa que não podemos abraçar.
2 comments:
Já tinhas lido o livro?
Parece-me muito difícil transpor para cinema...
Passei para deixar um abraço com votos de Boas Festas!
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