- Em que é que pensas quando estás a dançar?
- Penso em ti. Mas não devia.
- Porquê?
- Porquê o quê? Porque é que penso em ti ou porque é que não devia?
- Porque é que não devias.
- Não sei.
- Isso não é resposta.
- Eu sei que não é. Mas às vezes “não sei” é o melhor que se pode saber.
- E porque é que pensas em mim?
- Porque a tua imagem fala mais alto do que a música.
- Então quando danças, danças para mim?
- Se fosses menos presunçoso tinhas mais charme...
- Isso é um não?
- De certa forma é um "sim". Mas só porque não estás lá. Se estivesses, não o faria.
- Porquê? Achas que isto é um erro?
- “Porquê, porquê”. Já devias ter ultrapassado a idade dos “porquês”.
- Sim ou não?
- Talvez...mas mesmo que seja um erro, pode não ser necessariamente errado.
- Tu adoras contra-sensos.
- A grande beleza disto tudo é ser um contra-senso.
- Disto, nós?
- Não, a vida. Isto pode ser errado porque tu és tu e eu sou eu, mas também pode ser a coisa mais certa do mundo porque tu és tu e eu sou eu.
- Pois... podemos estar a desperdiçar o melhor de nós porque mais tarde pode revelar-se o pior em nós.
- O pior é perdermos um pedaço de nós que não pode ser reconstruído. Mas esse pedaço também nunca poderá existir se não arriscarmos estilhaçá-lo, portanto.. Lá está o contra-senso outra vez. Ou o duplo senso.
- Como dois bailarinos. Tens que acreditar que o teu parceiro não te vai deixar cair mas se acontecer, tens que voltar a confiar nele. Ou então mudar de parceiro.
- Não, isso não. Eu gosto de dançar contigo.
- Mesmo que eu te deixe cair?
- Sim. Se for esse o caso, teremos apenas que aprender outra dança.
- Então é porque não sou assim tão presunçoso.
- És. Mas eu gosto de arestas por limar.
- Pretendes limar-me?
- Não, pretendo deixar-te exactamente como és.
- Isso é estranho.
- Eu sou uma pessoa estranha.
- És. Mas eu gosto de arestas por limar.
- Pretendes limar-me?
- Não, pretendo descobrir que não és tão perfeita como pareces.
- E não sou.
- Pois, esse é o grande problema. Se não fores, tornas-te ainda mais perfeita.
- Perfeito seria irmos dançar agora.
- E se eu não souber dançar?
- Claro que sabes. Uma dança é uma conversa sem palavras. E nós já falámos muitas vezes em silêncio.