Thursday, December 17, 2009

...

Fala do Homem nascido



Venho da terra assombrada

do ventre de minha mãe

não pretendo roubar nada

nem fazer mal a ninguém


Só quero o que me é devido

por me trazerem aqui

que eu nem sequer fui ouvido

no acto de que nasci


Trago boca pra comer

e olhos pra desejar

tenho pressa de viver

que a vida é água a correr


Venho do fundo do tempo

não tenho tempo a perder

minha barca aparelhada

solta rumo ao norte

meu desejo é passaporte

para a fronteira fechada


Não há ventos que não prestem

nem marés que não convenham

nem forças que me molestem

correntes que me detenham


Quero eu e a natureza

que a natureza sou eu

e as forças da natureza

nunca ninguém as venceu


Com licença com licença

que a barca se fez ao mar

não há poder que me vença

mesmo morto hei-de passar

com licença com licença

com rumo à estrela polar


in Teatro do Mundo, António Gedeão

Saturday, September 26, 2009

Sunday, August 30, 2009

Breakfast at Tiffany's



" If I could find a real-life place that made me feel like Tiffany's, then I'd buy some furniture and give the cat a name."
Truman Capote, Breakfast at Tiffany's, 1958, spoken by the character Holly Golightly



Thursday, July 30, 2009

Mad about you

Para os monstrinhos verdes que existem dentro de cada um de nós...


Bom início de fim de semana ;)

Monday, July 13, 2009

No teu deserto

"(...) E fiquei a pensar no que me tinhas dito antes, sobre os sahraoui: como não têm nada, absolutamente nada, poupam tudo. Poupam a água, poupam as energias viajando de noite para evitar o calor. Até poupam nas palavras.
- Mas tu não poupas as palavras: tu escreves. Todas as noites gastas uma hora a escrever um diário nesse teu caderno...
- Escrever não é falar.
- Não? Qual é a diferença?
- É exactamente o oposto. Escrever é usar palavras que se guardaram: se tu falares de mais, já não escreves, porque não te resta nada para dizer. "
Miguel Sousa Tavares, No teu deserto


"(...) As pessoas hoje «vão ao deserto», passeiam pelo sul da Tunísia e pouco mais. São incapazes de enfrentar a solidão. É por isso que vivem em redes sociais, virtualmente acompanhadas.
É o oposto dessa viagem em que o que é preciso é encontrarmo-nos só connosco, com meia dúzia de pessoas que são capazes de estar caladas durante cinco horas. Quem é que, hoje, é capaz de estar rodeado de pessoas e calado tantas horas? Ninguém. O silêncio dá medo, atordoa (...)"
Miguel Sousa Tavares in Visão

Wednesday, June 17, 2009

A insustentável leveza do Blá, Blá, Blá...



É dito que o aprender a lidar com o mundo e com as pessoas é sinal de maturidade. Profissionalismo. Realismo. Que o "jogo de cintura" é uma ferramenta essencial à sobrevivência do "Homem das Cavernas Moderno"( que é como quem diz o Homem que ataca com estupidez, ignorância e falta de respeito, e não paus). No entanto, para desenvolver essa ferramenta, aprendemos a controlar o nosso lado mais emotivo. A dada altura, passamos a reagir mais do que pensamos ou sentimos. Ou melhor, o que pensamos e sentimos é adormecido num canto precioso até termos espaço mental para "lidar com". Para "reflectir sobre". Se pensarmos ou sentirmos demasiado, com muita força, deixamos de conseguir reagir à selva diária e essa selva é um facto incontornável do nosso dia-a-dia. Podemos e devemos aprender a conhecê-la para sabermos navegar. Para não termos medo dos dragões que existem para além das fronteiras conhecidas dos mapas. É preciso conhecer as regras do jogo para ser um bom batoteiro...


Mas será que esse enfraquecer dos músculos do sentir é reversível? Estaremos com isso a fortalecer o nosso sistema imunitário ou a perder o controlo de funções vitais? Até quando podemos adiar o pensar mais, o sentir muito? Quando é que vamos arranjar espaço e tempo, se nunca paramos?
Será que os instantes que partilhamos com aqueles que amamos são suficientes para manter o nosso lado mais verdadeiro vivo?


Uma gargalhada, um olhar, um toque. São estas as âncoras diárias que nos prendem às emoções que o mundo teima em congelar. É esta a linguagem que substitui as palavras que a vida nos esgota.